A ‘conta fantasma’ que o governo criou para você pagar

A notícia, à primeira vista, é um sonho. O Governo Federal anunciou uma Medida Provisória (MP) que promete trazer justiça social e um alívio imenso para milhões de famílias brasileiras. A proposta é ousada: zerar a conta de luz para os consumidores de baixíssimo consumo e dar grandes descontos para outros. Uma medida que poderia beneficiar até 60 milhões de pessoas.

Em um país onde o preço da energia elétrica é um dos grandes vilões do orçamento familiar, a ideia de uma “conta de luz de graça” soa como uma bênção, uma política pública necessária e aguardada há muito tempo. É o tipo de notícia que todo mundo quer ouvir e compartilhar.

Mas, como em toda mágica, existe um truque. E neste caso, o truque é perigoso. A energia elétrica não brota do nada; ela tem um custo para ser gerada, transmitida e distribuída.

Se um grupo de 60 milhões de pessoas vai parar de pagar ou vai pagar menos, quem é que vai arcar com essa diferença? A resposta pode não estar explícita na sua fatura, mas ela chegará como uma “conta fantasma” para milhões de outros brasileiros.

O ‘presente’: quem terá direito à conta de luz de graça ou com desconto?

A Medida Provisória, de fato, tem um mérito social inegável. Ela visa proteger os mais vulneráveis. O plano do governo, que ainda precisa ser aprovado em definitivo pelo Congresso, estabelece duas faixas de benefício:

  • Isenção Total (Conta Zero): Para as famílias de baixa renda que consomem até 80 kWh por mês.
  • Desconto de até 15%: Para famílias com renda entre meio e um salário mínimo e que consomem até 120 kWh por mês.

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A ‘conta fantasma’: como os R$ 3,6 bilhões serão cobrados de você

Aqui está a parte da história que não é contada com alarde. Para cobrir o custo dessa isenção, o governo vai aumentar os encargos de um fundo chamado Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).

E quem enche esse fundo com dinheiro? Todos os outros consumidores de energia do país. Na prática, a conta dos beneficiados será redistribuída e diluída na fatura de todo o resto: a classe média, os comércios e as indústrias.

A estimativa é que essa medida gere um custo extra de R$ 3,6 bilhões por ano, que será pago por você. Não virá como um item separado, mas sim embutido no valor geral da sua tarifa, uma verdadeira “conta fantasma”.

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Mas o buraco é mais embaixo: o risco de apagões e a fuga de investidores

O problema, no entanto, é ainda mais grave do que um simples repasse de custos. Especialistas alertam que essa intervenção populista nos preços pode criar um caos no já frágil setor elétrico brasileiro, por três motivos principais:

  1. Afugenta investimentos: Medidas que alteram as regras do jogo e tabelam preços, como a infame MP 579 do governo Dilma, geram insegurança jurídica e espantam os investidores privados, que são essenciais para modernizar a rede e construir novas usinas.
  2. A rede não aguenta: O Brasil investiu pesado em energia solar e eólica, especialmente no Nordeste. Mas não investiu o suficiente em linhas de transmissão. O resultado é bizarro: hoje, o Nordeste gera mais energia do que consegue consumir ou transmitir, e essa energia é desperdiçada, enquanto o Sudeste, que precisa dela, é obrigado a ligar usinas térmicas, que são mais caras e poluentes.
  3. Ameaça de apagões: Sem investimentos e com uma rede sobrecarregada e mal planejada, o risco de blecautes e racionamentos, como os que já temos visto nos últimos anos, aumenta drasticamente.

A Medida Provisória, que tem validade de apenas 120 dias e precisa ser aprovada pelo Congresso, pode até trazer um alívio imediato para alguns, mas corre o risco de criar um sistema mais caro, instável e menos confiável para todos os brasileiros no futuro.

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